Artistas da indústria da música desabafam sobre pressão e saúde mental
No fim de setembro, o mês de conscientização e prevenção contra o suicídio, o cantor YOHAN fez um longo desabafo nas redes sociais, inspirado por nomes como Katy Perry, Britney Spears, Justin Bieber, e os brasileiros e amigos do cantor Piettro e Fiakra, entre outros. Ao levantar um debate sobre a saúde mental na indústria musical, ele se une a um grupo de artistas que já falaram sobre o tópico. Uma pesquisa de 2019 da Record Union indicou que 73% dos músicos independentes enfrentam problemas como ansiedade, depressão e estresse contínuo, podendo evoluir para burnout. Segundo uma pesquisa, de 2016, da Universidade de Westminster, em parceria com a Help Musicians UK, revelou que 71% sofrem com crises constantes de ansiedade.
Esta indústria muitas vezes anseia por números e valoriza raramente os artistas espalhados por todos os cantos. Vale pontuar que o caso de P. Diddy, dito como um dos maiores escândalos de Hollywood, evidencia como essa ‘máquina’ espreme e pode ser muito cruel. Acusado de diversos crimes sexuais, ele é um dos gigantes da música que usou e abusou da saúde mental de diversos nomes, como Cassie Ventura, para manter seu monopólio. No vídeo, publicado na última semana, YOHAN falou sobre as dificuldades que enfrenta em sua carreira. Ele revelou que, devido à pressão constante sobre músicos para alcançarem números astronômicos, sua saúde mental foi afetada.
Ele desabafou como essa pressão é recorrente no meio musical. Após a pandemia de 2020, uma pesquisa da Encore Musicians mostrou que 64% dos artistas entrevistados, sejam independentes ou com o apoio de gravadoras, cogitavam mudar de profissão.
“Vim aqui fazer esse vídeo do nada, porque acho que a minha última postagem foi no dia primeiro de setembro aqui no Instagram. Fotos de carrossel simples, vivendo a vida, relaxando, curtindo. Juro, estou em crise existencial. Principalmente relacionado à minha carreira: Onde eu estou indo? Onde eu quero chegar? Quando eu vou chegar? Acho que isso é o mais aterrorizante dessa crise toda, né? É a ansiedade e a pressão que ela causa“, desabafou.
Impacto da pressão
Casos como os vocalista do Linkin Park, Chester Bennington, e do DJ e produtor Avicii, ambos vítimas de suicídio em 2017 e 2018, respectivamente, chamaram a atenção do público, mas não da indústria. Muitos fãs expressaram preocupação com a saúde mental de seus ídolos. Outros artistas, como Katy Perry, também falaram sobre como a pressão midiática e o hate online os afetaram. Perry, por exemplo, desabafou em um show de sua turnê “Witness”, dizendo que “não sabia se ainda iria ter fãs” após sofrer uma onda de críticas. Seu álbum seguinte, “Smile”, refletiu essa jornada de recuperação.
Britney Spears também enfrentou momentos difíceis em sua carreira. Em 2009, ela passou por uma série de problemas devido à exposição excessiva de sua vida pessoal e profissional. Após se libertar da tutela abusiva de seu pai, a princesa do pop decidiu se afastar dos palcos para preservar sua saúde mental.
Justin Bieber, por exemplo, chegou a cancelar o restante de sua turnê “Justice World Tour”, com problemas relacionados a sua saúde mental, além de lutar contra a doença de Lyme e a síndrome de Ramsay Hunt, que o gerou uma paralisia facial em 2019. O cantor também teve um momento comovente na gravação de “Yummy”, um de seus hits, onde chorou nos bastidores de exaustão. O cantor agora é pai de Jack Blues, seu primogênito do casamento com Hailey Bieber, e está afastado dos holofotes.
Demi Lovato é outro caso notório. Sempre na luta com a sobriedade, seus últimos trabalhos dialogam sobre a luta pela saúde mental. Desde sua overdose, em 2018, Lovato tem usado sua plataforma para promover a importância de buscar ajuda e desestigmatizar doenças mentais. Seu documentário “Dancing with the Devil” detalha sua trajetória pessoal e profissional, destacando a pressão da indústria e a importância da recuperação contínua.
Outros artistas têm falado abertamente sobre suas batalhas com a saúde mental e a pressão da indústria, como Lady Gaga, Shawn Mendes, Billie Eilish, Luísa Sonza, Manu Gavassi e Emicida, dono do projeto “Amarelo”, lançado em 2019, que abordou diversos assuntos, como a prevenção contra o suícidio na faixa-titulo ao lado de Majur e Pabllo Vittar.
Os nomes citados do mainstream evidenciam que a máquina e as engrenagens da indústria giram a favor do lucro, esquecendo até mesmo o impacto de cada um em cada segmento. A saúde mental, em um mundo ideal, deveria ser o ponto de partida. Sem ela, a arte não sobrevive de forma que mantenha ícones saudáveis e em paz com seus trabalhos.
84% dos profissionais de música, entrevistados pelo Music Support, relatado pela Clash Magazine, em 2022, revelaram sintomas de burnout, entre eles: exaustão, estresse extremo, irritabilidade, diminuição de sentimento de realização pessoal e esgotamento emocional. A síndrome pode levar a depressão e válvulas de escape nada saudáveis como o alcoolismo e a dependência química.
Hate nos artistas do Brasil
YOHAN também abordou a questão do ódio online que diversos artistas sofrem ao mudarem o direcionamento de sua carreira ou estilo musical. Ele apontou a diferença de tratamento entre artistas internacionais e brasileiros:
“É tudo acusação no Brasil, não é? Tudo é tiração de sarro e ninguém tem, de fato, sensibilidade com o próximo. É raro isso hoje em dia. Principalmente na internet sobre isso (mudança de direcionamento). E ele fala que está mudando porque ele quer. Ele está mudando um direcionamento porque ele pode. Porque ele é artista. E que a gente tem mania, né? De ser vira-lata, nós, como brasileiros, e pagar pau do papo internacional. E quando eles fazem qualquer tipo de mudança na carreira, no álbum, a gente aplaude de pé. E quando um brasileiro tenta fazer isso, um artista, a gente acha que ele já está se desviando, está mudando de caminho, está fazendo isto e aquilo.”
Projetos afetados
Ao final de seu desabafo, YOHAN contou que, devido aos problemas que enfrenta com o equilíbrio da saúde mental e pressão por resultados, decidiu adiar os próximos dois EPs da trilogia planejada. O primeiro EP, “Flores”, foi lançado em maio. Ele agradeceu aos fãs pelo apoio e disse que espera que os próximos capítulos de sua trajetória sejam ainda melhores.
“Planejei uma trilogia de EPs onde falaria sobre amor, sobre o humano, uma relação tóxica que vivi. Tivemos um bom alcance com este primeiro EP, mas não foi o que imaginei que pudesse ser. Sou grato sempre, claro, mas infelizmente, hoje em dia, a gente vive de números. Então, não alcançamos os números desejados. Era para já estarmos pensando no terceiro e último EP. Enfim, eu venho aqui só para desabafar mesmo. E falar que estou vivo e relativamente bem. Só que não. Não estou bem, mas é uma crise .E crises são assim“, finaliza.